- Por Luciana Barros -
As integrases foram descobertas em vírus que infectam células humanas e em fagos (vírus que infectam bactérias). Essas enzimas são capazes de inserir o DNA do vírus no DNA da célula hospedeira.
Algumas integrases de fago têm um potencial terapêutico enorme porque reconhecem sequências de DNA muito específicas [1]. Esta habilidade das integrases pode ser usada tanto para inserir genes no DNA como para alterar a orientação de um segmento gênico no DNA, seja um gene de interesse ou uma região reguladora como um promotor, por exemplo. Usando essa ferramenta, poderíamos inserir genes no DNA e decidir qual o melhor momento para ligá-los ou desligá-los ativando a expressão destas integrases.
Num recente trabalho publicado por nosso grupo em uma colaboração entre INCA, FIOCRUZ, UNB, EMBRAPA-DF, iDOR e UFRJ, mostramos que algumas integrases de fagos são capazes de ligar genes em células de plantas, bovinas e humanas. Dentre as células humanas, incluímos linhagens celulares, linfócitos T e células-tronco embrionárias. Algumas integrases se mostraram ativas, específicas e com baixíssima taxa de erro quando o gene foi invertido (o gene é cortado, rotado em 180º e é religado ao DNA no mesmo local) [2].
O reconhecimento da sequência de DNA que deve ser ligada se dá por duas regiões que ficam ao redor do gene de interesse, chamadas de sítios attB e attP. Cada integrase reconhece especificamente uma sequência attB e attP e corta o DNA nesses sítios. Depois o DNA é girado e religado na orientação inversa e a sequência dos sítios muda para attR e attL [3] . Dessa forma, o DNA fica para sempre na orientação desejada, o que era um desafio com as ferramentas de terapia gênica anteriores que seguiam rotando e religando o DNA indefinidamente enquanto a recombinase estivesse presente. Esse gene ligado pode ser desligado por outra integrase com novos sítios (se estas sequencias de reconhecimento estiverem presentes no alvo) ou por uma proteína chamada RDF (fator de recombinação de direcionalidade). Uma grande inovação é a utilização de circuitos lógicos (Boolean logic gates) destinados a ligar/desligar o transgene utilizando as integrases quando seus sítios são colocados em sequência. Dessa forma, circuitos gênicos podem ser ligados e desligados várias vezes de acordo com a combinação de integrases utilizadas, culminando numa resposta lógica de expressão gênica via recombinação do DNA como ilustrado na Figura 1.
Figura 1: Circuitos lógicos para ativação gênica. No alto os genes que codificam as proteínas fluorescentes vermelha (RFP) e verde (GFP) estão invertidos em relação a seus promotores e estão flanqueados pelos sítios das integrases 2 e 13, respectivamente. Ao inserirmos a integrase 2, o gene RFP é girado e fica no mesmo sentido de seu promotor, sendo expresso pela célula, que fica vermelha. À esquerda, temos a condição na qual a célula recebeu a integrase 13, que girou o gene do GFP somente e passou a expressar a proteína verde. Embaixo, é o caso que a célula recebeu as duas integrases, passando a expressar as duas proteínas fluorescentes simultaneamente, ficando amarela.
O controle de sistemas biológicos usando esses circuitos tem aplicações potenciais na fabricação de produtos biológicos, de saúde e biossensores [4] , além da geração de organismos geneticamente modificados. A aplicação tecnologia em linfócitos T pode criar um sistema de liga/desliga de receptores como CAR (Receptor Quimérico de Antígeno) utilizado em terapias celulares contra as leucemias [5] e em testes contra tumores sólidos [6].
Referências:
1. Olorunniji, F. J., Rosser, S. J. & Stark, W. M. Site-specific recombinases: molecular machines for the Genetic Revolution. Biochem. J. 473, 673–684 (2016).
2. Gomide, M. S. et al. Genetic switches designed for eukaryotic cells and controlled by serine integrases. Commun. Biol. 3, (2020).
3. Rutherford, K., Yuan, P., Perry, K., Sharp, R. & Van Duyne, G. D. Attachment site recognition and regulation of directionality by the serine integrases. Nucleic Acids Res. 41, 8341–8356 (2013).
4. Folliard, T. et al. Connecting Boolean Integrase Logic gates to a novel alkane control signal via engineered level matching. bioRxiv 031542 (2015) doi:10.1101/031542.
5. Boyiadzis, M. M. et al. Chimeric antigen receptor (CAR) T therapies for the treatment of hematologic malignancies: clinical perspective and significance. J. Immunother. Cancer 6, 137 (2018).
6. Watanabe, K., Kuramitsu, S., Posey, A. D. & June, C. H. Expanding the therapeutic window for CAR T cell therapy in solid tumors: The knowns and unknowns of CAR T cell biology. Frontiers in Immunology vol. 9 (2018).
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