- Por Luciana Barros -
O grande avanço no tratamento de câncer nos últimos anos é a imunoterapia, inclusive agraciando com o Prêmio Nobel de 2018 dois imunologistas por suas descobertas de receptores que funcionam como “freios” do sistema imune e o desenvolvimento de anticorpos monoclonais que permitam bloquear estas moléculas.
Ao longo da nossa vida, células no corpo sofrem mutações e produzem proteínas “anormais” que são reconhecidas como estranhas pelo sistema imune, os chamados neoantígenos. Assim que encontram neoantígenos, linfócitos T citotóxicos matam essas células. No entanto, algumas células com mutações conseguem impedir que o sistema imune reconheça seus neoantígenos e escapam da morte. As células transformadas usam esses “freios” do sistema imune para evitar a morte. Os novos tratamentos usam inibidores dos “freios” do sistema imune, também conhecidos como inibidores de checkpoint imunológico (ICBs). Apesar de muito efetivo em alguns pacientes, esse tratamento não funciona bem para todos os tipos de câncer, mostrando que tumores diferentes têm mecanismos diversos de escape do sistema imune.
Pacientes com câncer de esôfago têm baixa taxa de resposta à imunoterapia com ICB [1]. Num recente trabalho desenvolvido no INCA, investigamos o cenário da resposta imune em tumores de esôfago, causados principalmente pelo consumo de álcool, cigarro e bebidas muito quentes. Vimos que cada tumor possui um conjunto diferente de mutações e de neoantígenos, indicando um padrão personalizado de alterações genéticas. Por outro lado, verificamos que alguns genes estão expressos de forma aberrante na maioria destes tumores e que esta expressão anormal poderia ser alvo de terapias imunológicas, como a aplicação de vacinas antitumorais.
Além disso, cada paciente apresentou diferentes níveis de inibidores do sistema imune, o que ajudaria a explicar por que uma única terapia não funciona bem para todos os pacientes.
Diversos aspectos influenciam as populações de células imunológicas que serão encontradas nos tumores. Vimos neste trabalho que tumores com mais alterações no genoma têm mais plasmócitos (células produtoras de anticorpos) e células T foliculares [2]. Pudemos evidenciar também que os macrófagos do tipo M2, um subtipo comumente encontrado em tumores, também estão associados a um pior prognóstico, ou seja, os pacientes que tinham mais M2 viveram menos tempo.
Outro achado importante foi a presença de centros germinativos nos tumores. Nestas estruturas os linfócitos B são estimulados e proliferam, se diferenciando. Em linha com estes achados, evidenciamos que os pacientes com mais plasmócitos ao diagnóstico tiveram uma sobrevida mais longa, sugerindo um papel benéfico dessas células na evolução do tratamento dos pacientes.
O papel dos linfócitos B e dos plasmócitos em tumores ainda é controverso, mas trabalhos publicados recentemente também apontam para um papel benéfico dessas células na evolução de outros tumores como câncer de mama [3] e pâncreas [4,5], relatos que estão alinhados com nossos achados. Novos tratamentos devem ser desenvolvidos com foco nessas células nos próximos anos beneficiando mais pacientes.
Referências:
1. Zayac, A. & Almhanna, K. Esophageal, gastric cancer and immunotherapy: Small steps in the right direction? Translational Gastroenterology and Hepatology vol. 5 (2020).
2. BARROS, L. R. C. et al. High infiltration of B cells in tertiary lymphoid structures, TCR oligoclonality, and neoantigens are part of esophageal squamous cell carcinoma microenvironment. J. Leukoc. Biol. (2020).
3. Shen, M., Wang, J. & Ren, X. New insights into tumor-infiltrating B lymphocytes in breast cancer: Clinical impacts and regulatory mechanisms. Frontiers in Immunology vol. 9 470 (2018).
4. Sharonov, G. V, Serebrovskaya, E. O. & Yuzhakova, D. V. B cells, plasma cells and antibody repertoires in the tumour microenvironment. Nat. Rev. Immunol. 1,.
5. Hiraoka, N. et al. Intratumoral tertiary lymphoid organ is a favourable prognosticator in patients with pancreatic cancer. Br. J. Cancer 112, 1782–1790 (2015).
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