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Nem mono, nem bi – moléculas tri-específicas baseadas em anticorpos no combate de tumores

- Por Luiza Abdo


O uso de anticorpos monoclonais já se tornou uma estratégia consolidada no tratamento contra câncer. Estes têm como função reconhecer de forma específica uma proteína de interesse com intuito de bloquear sua interação com outra proteína ou recrutar células do sistema imune para auxiliar no combate do tumor. A fim de aperfeiçoar essa terapia e aumentar o número de interações de uma única molécula, novos desenhos de moléculas derivadas de anticorpos foram criados. Aqui queremos destacar o BiTE (Bi-specific T-cell engager), que são moléculas que possuem a porção Vh e VL com um espaçador, configurando um ScFV - single-chain fragments variable (Figura 1) fusionada a um scFv de um segundo anticorpo. Os BiTEs podem ter como função unir duas células diferentes de acordo com a proteína de escolha. Um exemplo que já está a clínica é o Blinatumomab, que é um BiTE em que uma porção reconhece o CD3 das células T e a outra reconhece CD19 das células B. Essa molécula tem como objetivo forçar a interação dessas duas células e induzir a lise das células B, em caso de tumores.


1- Figura esquemática do BiTE: O BiTE é uma molécula que une dois ScFv de anticorpos distintos para forçar uma interação das células T com uma célula alvo, geralmente células tumorais. Referência da figura: (BAEUERLE; REINHARDT, 2009)


Apesar dessa introdução, esse texto não irá falar do BITE, e sim uma proposta similar de uma molécula tri-específica. Essa ideia foi executada por Warmuth e colaboradores em um trabalho publicado recentemente (WARMUTH et al., 2021). O objetivo foi criar uma molécula que reconhece as proteínas 4-1BB, PD-L1 e HSA (albumina sérica humana) (Figura 2). O uso do 4-1BB é com intuito de auxiliar a ativação de algumas células T que já são capazes de reconhecer o tumor através da sinalização dessa molécula coestimulatória, contudo, já foi descrito que o uso sozinho de anticorpos contra 4-1BB podem causar toxicidade hepática. A outra porção da molécula tri-específica reconhece a proteína PD-L1, que é expressa em alguns tumores e tem função de inibir a atividade de células T que já tem potencial de reconhecer o tumor. Por fim, a última porção reconhece albumina sérica humana (HSA), na tentativa de aumentar a meia vida dessa molécula na circulação. Em resumo, a ideia foi criar uma terapia que irá bloquear a molécula inibitória PD-L1 e, concomitantemente, ativar uma célula T através do coestímulo 4-1BB, restringindo efeitos sistêmicos, além de aumentar a meia vida do composto.



2- Esquema da molécula NM21-1480: Molécula contendo 3 ScFv para reconhecer 4-1BB, PD-L1 e HSA. Referência da figura: (WARMUTH et al., 2021)


O primeiro passo foi selecionar quais clones eram ideias para essa construção, seguindo alguns pré-requisitos: (1) estimular 4-1BB e bloquear PD-L1 de forma concomitantemente, de maneira que o estímulo do 4-1BB seja dependente da expressão do PD-L1 no microambiente tumoral, (2) a ativação seja independente dos níveis de expressão do PD-L1 no tumor, (3) intensidade de estímulo do 4-1BB e PD-L1 sejam equiparáveis e (4) ativação do 4-1BB específica a tecidos tumorais, sem ativação das células T de forma sistêmica. Após diversos ensaios com diferentes clones e avaliação de afinidades, os autores criaram a molécula NM21-1480. Notou-se que o epítopo com o qual o α-4-1BB interage é de extrema importância para uma resposta eficaz, e o clone escolhido foi o que reconhecia uma região distal da molécula. Foram realizados também diferentes ensaios com linhagens celulares com diversos níveis de expressão PD-L1 e colocadas em co-cultura com a linhagem Jurkat e a molécula NM21-1480 para medir a atividade do 4-1BB, e foi possível validar que os níveis da atividade do 4-1BB da Jurkat eram relacionados positivamente aos níveis de expressão do PD-L1. Testes com linhagens celulares PD-L1+ e PBMC também foram realizados, demonstrando uma maior liberação de citocinas e maior presença de marcadores de ativação quando NM21-1480 estava presente.

Após a validação in vitro, ensaio em animais foram realizados. No primeiro momento utilizaram camundongos enxertados com a linhagem de câncer de pulmão de células não pequenas PD-L1+, HCC-827. Após o tratamento com NM21-1480, foi possível notar uma redução no volume tumoral em relação aos controles: Controle IgG, anticorpos monoclonais α-4-1BB + α-PD-L1, Avelumab e Urelumab. Além disso, NM21-1480 estimulou infiltrados de linfócitos T CD8 intratumoral. Por fim, fizeram teste em primatas para avaliar se essa molécula poderia apresentar alguma toxicidade. Nas 3 distintas concentrações de NM21-1480, não houve nenhuma alteração nos níveis das enzimas ALT e AST, que representam a presença ou não de alguma anormalidade no fígado, além de fotomicrografias não alteradas do mesmo órgão. Também foi possível validar que não ocorreram alterações nas subpopulações de memória das células T no sangue periférico e ademais determinaram os níveis citoplasmático da molécula NM21-1480, validando a não toxicidade desse fármaco.

Dito isso, nesse artigo eles demonstraram que é possível criar uma molécula baseada em anticorpo tri-específica e identificar as afinidades para criar um fármaco que seja responsivo às diferentes proteínas encontradas na superfície celular. Também foram realizadas diversas validações em linhagens in vitro e ensaio em camundongos para avaliar a eficácia na atividade antitumoral. Por último, foi realizada a avaliação da farmacocinética e toxicidade em primatas, demonstrando que NM21-1480 é uma molécula segura. Assim, os autores já iniciaram testes clínicos em humanos na tentativa de aperfeiçoar mais uma imunoterapia com potencial de resultados satisfatórios, sendo então uma possível alternativa no combate de tumores com que possuem diferentes níveis de PD-L1.


Referências:


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